Foto: Lucas Moura/Secom
O percurso do Fogo Simbólico do Dois de Julho, no Bicentenário da Independência da Bahia, ganhou um novo roteiro neste ano de 2023. Na manhã desta sexta-feira (30), além do tradicional percurso que sai de Cachoeira, o Fogo Simbólico também partiu de Mata de São João e passará pelos municípios de Dias d’Ávila, Camaçari, Lauro de Freitas e Simões Filho, onde a chama se unirá à do roteiro tradicional, rumo ao destino final no bairro de Pirajá, em Salvador.
A inclusão dos municípios de Mata de São João, Dias d’Ávila, Camaçari e Lauro de Freitas nas celebrações do Dois de Julho foi autorizada pela Fundação Gregório de Mattos (FGM), atendendo à solicitação feita pelo Consórcio Intermunicipal Recôncavo Norte e pelo historiador e pesquisador Diego Copque, que apontam contribuições importantes desses municípios, no processo de consolidação da Independência do Brasil na Bahia.
O roteiro tradicional tem saída de Cachoeira e passagem pelas cidades de Saubara, Santo Amaro, São Francisco do Conde, Candeias e Simões Filho. A pesquisa realizada por Copque deu origem ao livro Presença do Recôncavo Norte da Bahia na Consolidação da Independência do Brasil, publicado em maio de 2022. Para o pesquisador, a incorporação desses municípios na programação da festa fortalece a autoestima e o sentimento de pertencimento das pessoas que vivem nessa região, valorizando a singularidade histórica, geográfica e cultural.
Resgate histórico – “Esse pleito vem no sentido de reparação e de perceber que a história, a identidade e a cultura de uma região estavam sendo perdidas e, se alguém não buscasse uma espécie de despertar e de reparação, se perderiam muito mais”, revelou, destacando o empenho do pesquisador Coriolano Oliveira, de jornalistas e da comunidade local para a obra. “Nós iniciamos essa luta há quase uma década, a campanha foi ganhando força, até o reconhecimento da FGM”, conta satisfeito Diego Copque.
Para o gerente de Promoção Cultural da FGM, George Vladimir, a participação do fogo simbólico no Recôncavo Norte tem dupla importância: a primeira é o reconhecimento e a legitimação da participação dessas cidades na luta pela Independência e, a segunda, a reparação histórica. “Há mais de 50 anos, essas cidades integravam o percurso do fogo simbólico nos dias que antecedem a celebração, mas, a partir de um determinado momento, devido à inauguração do polo de Camaçari, elas saíram do circuito. Então é uma medida de reparação histórica, que foi solicitada pelo Consórcio Intermunicipal Recôncavo Norte e prontamente atendida”, afirma.
Reforço de tropas – Em seu livro, Diego Copque registra que na manhã de 19 de fevereiro de 1822, os militares portugueses invadiram o Forte de São Pedro (atual região do Campo Grande) e outros dois quartéis localizados em Salvador, que alojavam tropas de brasileiros. Os brasileiros foram derrotados e fugiram para se reagrupar no Recôncavo Norte, na Casa da Torre Garcia D’Ávila, território hoje pertencente à Mata de São João.
No Recôncavo Norte, a tropa patriota foi recepcionada pelo senhor da Torre, Antônio Joaquim Pires de Carvalho e Albuquerque e lá recebeu reforços de milicianos, indígenas, e caboclos remanescentes da Vila de Abrantes, Arembepe, Barra do Jacuípe e Monte Gordo, para depois voltar e lutar em Salvador. Os irmãos Pires de Carvalho e Albuquerque foram responsáveis, juntamente com o mercenário francês Pedro Labatut, por formar e dar um caráter militar ao exército brasileiro, que libertou a província da Bahia e o Brasil das forças portuguesas.
Provisão e armas – Já a Feira de Capuame (situada no território hoje denominado município de Dias d’Ávila), foi responsável pela provisão de carne, para sustento do exército patriota que lutou contra as forças portuguesas. Em outubro de 1822, a Feira de Capuame, primeira feira de gado da América Latina, tornou-se um arsenal de guerra, com uma oficina instalada para a manutenção dos armamentos disponíveis e improvisados pelos patriotas, sendo, por alguns dias, base da milícia da Casa da Torre.
Entre os atores da cena política e militar de Vila de Abrantes (região de Camaçari) estão o indígena tupinambá Joaquim Eusébio de Santa Anna, capitão-mor dos índios de Vila de Abrantes e Cipriano José Barata de Almeida, jornalista, cirurgião, filósofo, político e senhor de engenho de cana de açúcar, em Vila de Abrantes. Ele se destacou como um dos mais ativos combatentes em favor da Independência do Brasil.
Nobres cavaleiros – Em relação à participação de Santo Amaro de Ipitanga, território hoje chamado de Lauro de Freitas, é possível destacar que importantes combatentes viviam nessa freguesia, a exemplo de Luiz Antônio Pereira Franco e Anastácio Francisco de Menezes Dórea, que foram agraciados pelo imperador com o título de Cavaleiros da Ordem de Cristo. Além disso, o engenho Cagi, em Santo Amaro de Ipitanga, funcionou como uma espécie de hospital de campanha durante as lutas pela Independência do Brasil na Bahia. O engenho pertencia a João Ladislau de Figueiredo e Melo, grande latifundiário da região, seu neto, José Alvares do Amaral, foi responsável pela compra do casarão que até hoje abriga os carros alegóricos dos caboclos na Lapinha, no bairro da Liberdade.
“Todo o povo baiano pegou em armas. Ocorre que não seria diferente com a região do Recôncavo Norte. Eram povoações, vilas de suma importância, a exemplo de Vila de Abrantes, que era uma vila indígena onde o Príncipe Regente D. Pedro de Alcântara foi aclamado como imperador constitucional do Brasil. A participação desses povoados teve uma importância crucial no processo de lutas pela Independência na Bahia”, conta Copque.
Articulação – O fogo do Dois de Julho representa a união dos povos para a conquista da libertação da Bahia e do Brasil. Ele representa também a chama da liberdade. “É uma chama que não pode ser apagada, por isso ela é passada de mão em mão, como se fosse uma esperança que não morre. Inclusive, é algo que bebe de uma tradição já antiga. Outras culturas também têm esse viés ligado à chama, sagrada ou não, mas que passa de mão em mão levando ideais, esperança ou mesmo concepção de liberdade”, explica o historiador e pesquisador Rafael Dantas.
O trajeto do fogo simbólico no Recôncavo Leste, e esse ano também no Recôncavo Norte, é organizado todos os anos pela FGM, em articulação com as prefeituras dos municípios participantes e com a parceria do Exército do Brasil, da Polícia Militar, da Guarda Civil de cada município e dos órgãos de saúde. Uma equipe da FGM, formada por técnicos de produção e um motorista, acompanha os atletas durante todo o percurso nos dias de passagem do Fogo Simbólico, juntamente com a equipe de cada cidade, fornecendo água, repondo o querosene e fornecendo o aparato necessário.
O órgão também é responsável por escolher uma pessoa para acender a pira do fogo simbólico, no Campo Grande, no dia 2. Esse ano, a atleta paralímpica e multicampeã na natação, Verônica Almeida, de 48 anos, foi o nome escolhido para o ato solene. É a primeira vez que a tocha será acesa por uma atleta paralímpica.
Celebração – Para comemorar os 200 anos de Independência do Brasil na Bahia, que este ano tem como tema “Salve nossa terra, Salve o Caboclo”, Salvador terá uma programação especial entre os dias 30 de junho e 25 de julho, que prevê a entrega do novo Largo da Lapinha, do novo Memorial Dois de Julho e do monumento à Maria Felipa, na Praça Cairu, além de apresentações culturais, ações nas escolas e retorno do concurso de fachadas ao longo do percurso do desfile cívico.
No domingo (2), dia do desfile cívico, o grupo BaianaSystem apresentará o Sambaqui, show especial que ocorrerá na Praça Cairu, no Comércio, às 19h, e contará com os convidados Lazzo Matumbi, Raquel Reis, Vandall, Caboclos de Itaparica, Afrosinfônica, Liz Reis, Cláudia Manzo e Elivan Conceição.
Reportagem: Priscila Machado/Secom